Dobra Sim, Dobra Não, Eis a Questão

06/11/2008 13:12

 

DOBRA SIM, DOBRA NÃO, EIS A QUESTÃO

Alex Pussieldi
Publicado em 19/10/2008

Há quatro anos escrevi aqui na Best Swimming um artigo sobre o treinamento duplo. Passado este último ciclo olímpico, não tivemos nenhuma mudança ou significativa alteração na avaliação fisiológica dos resultados do treinamento dobrado e os conceitos ainda são os mesmos. Infelizmente, por questões de logística, de estrutura e as vezes até econômica ou conveniência, nossos atletas estão nadando menos do que anos atrás. Qualquer treinador pode avaliar e comparar suas agendas de treinamento de hoje e de 10 anos atrás e vai ver que a média da quilometragem das equipes principais teve uma caída significativa. Coincidência ou não, não há dúvida de que os resultados da natação de fundo do Brasil caíram vertiginosamente.
Treinar duplo é, e sempre será, um sacrífico a mais. Combinar duas sessões de treinamento com as dificuldades de locomocação, distância, horários e outros compromissos é parte do problema. Entretanto, a solução não é simplesmente eliminar o trabalho duplo.
Acordar as 4 e 30 da manhã é um sacrifício tremendo para o atleta e também para a família do atleta. O deslocamento até a piscina é complicado como também é complicado o fim do treino em tempo para chegar a escola em tempo hábil. Acredito piamente no trabalho duplo e não abro mão deste treinamento em meu programa, como todos os grandes nadadores a nível internacional fazem. A questão é como organizar os horários e as responsabilidades sem comprometer nenhum lado e acima de tudo dar ao atleta o descanso necessário entre as sessões.
Sobre isso acontece algo no Brasil que para mim não faz sentido algum. Realizar um treinamento duplo as duas da tarde até as quatro, descansar por uma hora e voltar para a água as cinco não tem qualquer benefício fisiológico. Dobra é um treinamento complementar que pode tanto ser aeróbico, como anaeróbico e até combinado. O atleta precisa render como em qualquer outra sessão de trabalho. Simplesmente escrever o treinamento no quadro, sem qualquer assistência, ou entregar um papel ou via email não é a forma ideal de trabalho. Pior ainda é o Head Coach mandar o assistente cuidar do treinamento da madrugada como se aquilo que fosse lá acontecer não merecesse nem sua presença.
Lembro que testei de forma errada os efeitos de não respeitar as horas de adaptação do corpo. Sofri um acidente em Recife há alguns anos e levei um profundo corte no braço. A receita do remédio Tandrilax e uma revolta muito grande por ter sido numa tentativa de assalto. Cheguei em casa, antes de dormir não tomei o primeiro comprimido de Tandrilax e esperei as próximas oito horas para tomar o segundo. Tomei logo três, o que na minha cabeça eram três vezes oito horas, 24 horas, não preciso tomar esta coisa mais e vou dormir. Pois a dormida foi profunda e dolorosa. Tive uma crise tremenda de rins e não consegui levantar por várias horas. O efeito de um remédio que seria algo positivo para meu corpo quase me leva para o hospital em um caso de intoxicação. Vejo o treinamento duplo da mesma forma. Ele foi designado para ajudar, para complementar o trabalho de desenvolvimento do atleta. Mal  administrado, o treinamento duplo só atrapalha.
O treinador quando faz o seu programa deve analisar caso a caso para avaliar as dificuldades e a logística de cada um de seus atletas e colocar em prática um trabalho que atenda as demandas e dificuldades do seu grupo. O atleta e a família, da mesma forma, precisam estudar com atenção as opções de clubes e escola afim de que as distâncias e a logística não seja comprometida por conta disso.
O treinamento duplo é algo altamente importante e que pode ser decisivo no desenvolvimento do atleta. Planejar este trabalho com atenção é fundamental para o seu sucesso.
 
Coach Alex Pussieldi, editor chefe da Best Swimming Inc, Head Coach do Davie Nadadores Swim Team e da Seleção Nacional do Kuwait.